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22 dezembro 2004

Falando de Natal

Álvaro Melo, Rio de Janeiro

Alguns acham chatíssimo falar em Natal nessa época. Ué, vamos falar de Natal quando? Talvez seja uma época que mais me traz reminiscências da infância. Ceávamos no dia 24, mas os presentes só chegavam durante a noite, depois que íamos dormir.

Eu disse dormir? Viajei... Era apenas um estado letárgico, provocado pelo cansaço do dia e a espera da ceia, cheio de cortes abruptos entre consciência e inconsciência onde ouvíamos eventuais passos furtivos do Papai Noel que não satisfeito em depositar presentes abria geladeira e mexia em armários (nada como conhecer os sons da própria casa...).

Essa noite torturante geralmente acabava encurtada, pois antes do sol nascer a insônia ansiosa me tirava da cama e quando os outros se levantavam, por mais cedo que fosse já me encontravam à postos, sentado no chão ao lado dos presentes, os quais já devidamente apalpados, cheirados e, às vezes, adivinhados.

A juventude adolescente matou esse encanto e o Natal passou a ser um momento de comidas raras e gostosas, presentes utilitários e eventuais visitas de parentes e outros chatos aos quais tínhamos que dar atenção, preterindo nossas intenções de encontrar a turma para as programações peculiares à tribo-época-idade.

Depois do casamento o sentido familiar do Natal volta a ser realçado. Fazer dos filhos o espelho da infância é normal e natural, a menos que a infância não seja fonte de boas recordações...
Com o passar do tempo a família se amplia: mais filhos, primos, e damos conta da inevitável divisão entre família dela e família dele. Muitas vezes sem o menor stress, mas sempre requerendo habilidade e diplomacia para não criar “climas” e situações tipo “saia justa”.

O passar do tempo deixa experiência em troca de juventude e os Natais vão se alternando entre melancólicos e alegres, dependendo do que aquele ano tenha trazido ou levado. Mas a experiência que vai crescendo e se aprofundando mais fortemente é aquela de que se trata de um momento raro e felizes são aqueles que têm família e o que comemorar ou recordar. Não é hora de ressuscitar velhas rivalidades, remoer mágoas antigas, nem aproveitar o momento para exibições que não tenham o senso comum. Também não é hora para reparar se um trouxe mais e outro menos, a despeito de situações financeiras inversas. As pessoas são como são e cada um dá de si o que julga correto ou suficiente. O importante somos nós, individualmente, e a nossa consciência. O importante é ter prazer naquilo e proporciona-lo com a mesma intensidade. O importante é não se tornar credor do Natal e sim doador. O empréstimo, mesmo que em sentido figurado, gera cobranças e expectativas ansiosas. A doação eleva, aplaca e serena.

Pois é, comecei no burlesco e acabei falando sério. Deve ser o espírito do Natal se manifestando através deste que pretende ser apenas um filósofo barato, de botequim. Etílico-barato-filosofia é um credo de alto risco para portadores de diabete, e assim posso me sentir equiparado aos praticantes de esportes radicais aos quais saúdo com o copo que estiver à mão e o conteúdo que couber à ocasião.

Saúde e paz!
Feliz Natal!

Um comentário:

Lucas disse...

Caraca Cara, muito bom esse post. Natal, data tão mágica para alguns e tão detestada por outros..., lembranças de natais passados... os que vão vir....
passa depois no meu blog, postei algo bastante interessante. Falows!